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Livros Etc

por Josélia Aguiar

Perfil Josélia Aguiar é jornalista especializada na cobertura de livros

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História para o grande público: uma conversa com Isabel Lustosa

Por Joselia Aguiar
26/03/12 12:42

 

Começa a fazer um sol bonito em Paris nesses primeiros dias de primavera, mas Isabel Lustosa cedeu ao blog ontem, um domingo, um pouco do seu tempo ao ar livre para responder a perguntas sobre Dom Pedro I, as tantas obras que o fidalgo português inspirou no decorrer do tempo e o desafio de escrever para o grande público – perguntas que pensei em lhe fazer desde o post mais recente, a respeito do romance sobre o imperador escrito pelo best-seller espanhol Javier Moro.

É de Isabel, professora e pesquisadora que publica biografias e obras de abordagem histórica, o ótimo e relativamente recente livro sobre Pedro I, o da capa acima, publicado em 2006 pela Companhia das Letras.

O personagem ainda a acompanha: em Paris, onde fica até junho como titular da cadeira Sergio Buarque de Holanda, ligada à Maison des Sciences de l´Homme, uma das pesquisas em andamento trata de como a imprensa francesa noticiou o imperador quando ali morou entre a abdicação do trono no Brasil e a guerra em Portugal contra o irmão Dom Miguel – pelo que entendi, o cara fez muito sucesso na vida parisiense.

  
“O Império é Você”, de Javier Moro, deve ser a primeira representação literária de Dom Pedro I feita fora do Brasil. E também só me recordo de filmes e minisséries brasileiros. Em Portugal, houve algo do gênero? “Eu também não conheço versões romanceadas de sua vida a não ser as publicadas no Brasil por Sonia Sant´Anna e Vera Moll. Não tenho preconceito contra esse tipo de livro. O personagem merece. É rico, é contraditório, tem uma biografia movimentada que se presta bem ao romance. Tomara que façam mesmo um filme sobre ele. Só acho Javier Bardem um pouco velho para o papel. Dom Pedro I morreu com 36 anos.”   

Se não Bardem, quem? “Gosto de Rodrigo Santoro, que tem cara de mais jovem do que é.”

Mas as biografias são muitas. “No campo do jornalismo de ensaio ou literário, digamos assim, é vasta a bibliografia liderada por Paulo Setúbal, Viriato Correia, Alberto Rangel, Assis Cintra e Luiz Edmundo. Creio que o fascínio por Dom Pedro I é mais brasileiro que português. Escritores importantes como Almeida Garret e Alexandre Herculano lutaram ao lado do nosso ex-imperador quando este voltou a Portugal para reconquistar a coroa para sua filha Maria da Gloria. A imagem que eles têm de Pedro I é muito mais reverente que a nossa. Existem também alguns livros sobre os dois irmãos, Pedro e Miguel, relativos à guerra vencida pelo primeiro e que pôs no trono Maria II. Creio que há mesmo entre os historiadores portugueses uma divisão entre miguelistas e pedristas. Estrangeiras, existem duas biografias bem conhecidas: a do americano Neil Macaulay e a da francesa  Denyse Dalbien.”

Então há de fato muita diferença na visão que  Brasil e Portugal têm de Dom Pedro I? “Creio que sim. Em Portugal, de onde saiu aos nove anos para só retornar aos 34, dois deles passados no campo de batalha, o que prevalece é a imagem do herói constitucional, do salvador da pátria que voltou para levar instituições modernas e liberais a um país dominado pelo absolutismo que seu irmão dom Miguel representava. Assim lá não tem muito lugar todo o folclore relativo às tantas amantes reais ou imaginadas que se lhe atribui.”

A transformação de Dom Pedro I em herói marcial, “certinho”, o Tarcisio Meira do filme, se dá no período militar? “As tentativas de tornar Pedro I um herói certinho como você diz seguem um pouco a linha adotada pela historiografia do século 19 que chegou aos nossos dias tentando sempre atenuar seus defeitos. Digo isto no prefácio de meu livro. Sobrou para Leopoldina, coitada, que alguns autores como Alberto Rangel quase culpam pelo fato de ter sido tão humilhada e maltratada pelo marido e por sua amante, Domitila de Castro. Mas obras como a do injustamente pouco lido e pouco citado Tobias Monteiro, a de Carlos Oberacker e, mais recente, a de Maria de Lourdes Viana Lyra, do IHGB, e a minha própria, vêm procurando jogar um pouco mais de luz sobre essa mulher tão interessante. Sua correspondência foi publicada também no Brasil há poucos anos.”   

A obra de brasilianistas trouxe algum ângulo novo na análise da figura de Dom Pedro I no decorrer do tempo? “Gosto dos livros do Macauly e da Dalbien. Acho autores honestos que se estendem mais sobre aspectos da vida do imperador fora do Brasil e que ajudam a dar-lhe uma imagem mais universal. O trabalho de Dalbien foi muito inspirador para a pesquisa que desenvolvo atualmente.”

E qual é o Dom Pedro I que você encontrou? “É um personagem riquíssimo e que, espero, ainda vá inspirar muitos livros, filmes e peças de teatro. Pensando sobre ele, os autores e seus leitores são obrigadas a saber – e a refletir – um pouco mais sobre o Brasil e seus caminhos e descaminhos. Eu o acho fascinante em suas contradições e seus ideais. Seu dilema entre ser português e ser brasileiro. Sua atração pelas modernas idéias constitucionais e liberais que abraçou e os problemas que elas traziam para a plena realização de seu destino. Pois foi sempre um Bragança e nunca abriu mão das prerrogativas que considerava parte essenciais de seus direitos dinásticos. Do ponto de vista íntimo, havia suas paixões e emoções exaltadas que faziam contraste com os sentimentos afetivos mais delicados. Podia ser ao mesmo tempo simpático, jovial e familiar e hierárquico, autoritário e despótico. Violento e amoroso; patriota e cínico; generoso e avarento… tudo isto e mais alguma coisa foi Dom Pedro I.”

Você tem algum palpite para explicar por que o romance histórico tem sido um gênero pouco adotado por autores brasileiros, embora o leitor pareça gostar tanto? “O Brasil tem uma vasta tradição de crônica histórica, esse tipo de relato meio jornalístico meio literário, que é tão caracteristicamente nosso e que foi adotado por muitos de nossos escritores e jornalistas.  De qualquer maneira, para lembrar alguns, Rubem Fonseca tem um ótimo livro sobre 1954, “Agosto”; Antonio Callado tem outro que adoro sobre a ditadura de 1964, “Reflexos do Baile”; “Incidente em Antares”, do Érico Veríssimo, pode ser considerado um romance histórico, sem falar de toda sua obra sobre a Guerra dos Farrapos. Mesmo os romances regionais de José de Alencar e algumas das obras de escritores nordestinos que contemplaram temas como o coronelismo e o cangaço podem ser incluídos, sem muito favor, no selo de romance histórico.” 

 Nas nossas universidades, a influência da Escola dos Annales acentua-se  a certa altura e com isso o grande personagem desaparece das narrativas. Parece haver de novo uma revalorização do grande personagem, ao menos do ponto de vista editorial. “Creio que depois dos trabalhos de Carlos Guinzburg, Robert Darnton, Nathalie Zemon Davis, e da maior penetração não só das metodologias como também das teorias tem existido por parte dos historiadores um maior interesse em produzir uma obra historiográfica que atinja maior número de leitores sem prejuízo do rigor. Não é apenas a valorização do personagem mas também a convicção de que se chega ao universal a partir do particular. Não se trata apenas da produção de estudos de caso, de trabalhos monográficos, mas de uma produção que, partindo do particular, ouse pensar o geral. Para tanto o conhecimento da bibliografia teórica que contempla os mesmo tipos de problemas continua a ser referência obrigatória  –sem que, no entanto, tal como se fazia nas teses antigamente, seja obrigatório resumi-la de forma fatigante e exaustiva nas primeiras páginas do livro, espantando o eventual leitor.”

De sua experiência com obras que buscam atrair um leitor não especializado, o que pode dizer das dificuldades, dos desafios? “Creio que escrever de forma clara e objetiva não deve ser obrigação exclusiva do autor voltado para o público não especializado. Felizmente a academia vai despertando para a importância da clareza da escrita, que em nada compromete o conteúdo, ao contrário, mais o valoriza. No caso específico da biografia dos chamados “grandes personagens”, cabe ao historiador manter-se preso ao solo, relativizando sempre, para evitar ser seduzido pelo seu herói. O conhecimento do contexto e das condições em que viveu o objeto de seus estudos é fundamental. Nunca esquecer que, sendo seu objeto de estudo um imperador ou um escravo no Brasil do século 19, eram homens agindo de acordo com suas circunstâncias, suas paixões e interesses. Esses têm que ser bem conhecidos, analisados e explicados. ”

 

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A nova e já polêmica biografia do imperador: "Javier Bardem seria um perfeito Pedro I", diz autor espanhol Javier Moro

Por Joselia Aguiar
22/03/12 14:36

Autor de histórias romanceadas que se tornam best-sellers em vários países do mundo, como “Paixão Índia” e “Sári Vermelho”, Javier Moro, espanhol,  57, dedicou-se durante três anos a Dom Pedro I, a quem vê como misto de Dom Quixote e Don Juan, cuja história, “fabulosa mas bastante vilipendiada”, precisava viajar.

“O Império é Você” é seu romance sobre Pedro I que vendeu 400 mil exemplares na Espanha e lhe fez merecer o prêmio robusto de 600 mil euros da sua editora, o grupo espanhol Planeta. No Brasil, segundo país onde publica o livro, os leitores ainda não reagiram, mas colegas de empreitada sim: autores de obras que têm Pedro I como personagem, os jornalistas Laurentino Gomes (“1822”) e Iza Salles (“O Coração do Rei”) viram no romance de Moro clichês, imprecisões e erros, de acordo com reportagem publicada pelo jornal “O Globo” —por aqui, você chega até lá.

Com certo humor e um bocado de branda indignação, Javier Moro conversou comigo na segunda-feira no jardim do hotel em que se hospedou em São Paulo. Horas depois, viajaria para autógrafos e entrevistas em Belo Horizonte, Curitiba, Brasília, Rio de Janeiro –fica duas semanas no país.

A reação de Laurentino Gomes e Iza Salles, segundo Moro, decorre de nacionalismo, o que considera “uma estupidez”. Diz que, como romancista  –com experiência em cinema e TV nos EUA, onde colaborou com Ridley Scott, diretor de filmes como “Blade Runner” –, concentra-se no drama e inventa cenas e diálogos, apesar de se cercar de material histórico. “Estão julgando um barco como se fosse um carro.”

O senhor já respondeu a essa pergunta em outras entrevistas, mas vou fazer de novo: como descobriu Dom Pedro I? “Foi quando morei no Brasil entre 1989 e 1990 para fazer o livro sobre Chico Mendes [“Caminhos de Liberdade”, de 1992]. Eu me apaixonei pelo Brasil, aqui fiz bons amigos e o senti como meu segundo país. Quis saber sobre a história do Brasil, e havia esse personagem que me seduziu muito. Primeiro porque, filho de Carlota Joaquina, ele tinha muito de espanhol, em seu caráter, seu temperamento. Em sua educação também: nos primeiros anos de vida, foi criado pela mãe e as criadas espanholas.”

Foi essa ligação com a Espanha que o seduziu? “Não, porque se os chineses tivessem me contado sobre um grande personagem chinês, teria escrito sobre ele. Não sou nada nacionalista.”

Por que quis escrever sobre ele? “Nunca encontrei um livro sobre independência do Brasil como eu gostaria de ter escrito. Pressenti que era uma história grande. Não era só a biografia de Pedro I. Queria fazer o grande épico da independência do maior país da América do Sul através da família real. Queria contar essa história, que coincide com o fim do absolutismo e o princípio da luta pela liberdade. E aí vi que Pedro I era um personagem vilipendiado pela história.”

O senhor comenta em entrevistas que entendeu que Pedro I não era aceito nem no Brasil nem em Portugal…  “Acabo de descer no elevador com um senhor brasileiro muito simpático que, quando contei que escrevi esse livro, me disse imediatamente: “mas por que não escreveu sobre Pedro II?” Não é  o primeiro que me falou isso. Não escrevi porque Pedro II era demasiado perfeito. Era formal, tinha uma só mulher, era culto, falava seis idiomas, reinou 50 anos, acabou com a escravidão. Que vou contar dele?  Seria como contar a vida da Madre Teresa!  Ninguém ia ler. O pai é um personagem muito mais interessante, pois muito mais contraditório. Creio que maltratado pela história porque é incômodo. É incômodo dar-lhe importância. O cara era o cúmulo da contradição”.

Há livros sobre a história do Brasil que relativizam a importância de Pedro I…  “Discordo. Esse personagem foi fundamental. Não teve o devido reconhecimento histórico no Brasil. Não tanto por sua vida dissoluta, mas porque ele nunca entrou num molde. No Brasil, achavam que era demasiado português, e os portugueses achavam que era traidor. Mas ele não era nacionalista brasileiro, nem nacionalista português. Ele era o imperador do mundo lusitano. Para ele romper com qualquer uma das partes era difícil.”

Pelo visto, a história dele agradou a Espanha. Já vendeu 400 mil exemplares.   “Os espanhóis não sabiam nada de Portugal, do Brasil menos ainda. E há uma história comum, Espanha e Portugal teriam sido um único país.”

A rivalidade explica o desinteresse? “A rivalidade é normal entre vizinhos. Os franceses pensam que os espanhóis são de segunda. Os espanhóis, que os portugueses e os  marroquinos são de segunda. Os brasileiros pensam o mesmo de bolivianos e paraguaios. O que não é normal é a ignorância total,  porque a história de Portugal é fascinante. Como Portugal, sendo um país tão pequeno, chegou aos quatro continentes e pôde manter unidas suas colônias, e a Espanha, um país imperial, conseguiu fragmentar as colônias a tal ponto que, se você olha, é um desastre. Creio que o fato fundamental é que a família real portuguesa mudou o centro de gravidade do império para cá, coisa única na história, nenhuma monarquia se transferira para as colônias. É uma história fabulosa. Eu reivindico o mesmo que Saramago:  fazer uma federação ibérica”

O senhor concorda com Saramago? “Claro! A ideia é fantástica.”

Saramago ganhou antipatias em Portugal com essa ideia, e seu livro ainda não foi lançado lá…. “Mas é perfeita a solução. Somos todos ibéricos, como dizia Saramago. Essa é a grande verdade. É que hoje não dá para falar muito disso na Espanha, porque é tão grande o problema da dívida de Portugal….”

Como fez as pesquisas sobre Pedro I?  “Lendo tudo o que estava escrito. Em Lisboa, consultei bibliotecas de lá. Fui onde nasceu e morreu.”

Viu o coração de Pedro I no Porto? “Não deixam ver.”

Está no youtube!  “Ah, sim? Depois, vim a São Paulo. Pedro Corrêa do Lago [bibliófilo e editor] me ajudou com muitas fontes. No Rio, fui a bibliotecas, livrarias, sebos, lugares onde Pedro I passou. Voltei com uma grande documentação. Fiquei durante um ano só lendo. Eu queria encontrar qual era a coerência nas incoerências do personagem. Para poder fazer um Pedro I humano, para que pudessem simpatizar. Com aquelas atitudes terríveis, o leitor ia parar de ler. Um amigo que faz filmes me recomendou ver a série americana dos “Sopranos”. Fui ao Corte Inglés [grande rede de lojas]. Comprei tudo e vi em poucos dias”.

Os “Sopranos” então o ajudaram a compreender Pedro I? “O personagem principal é um mafioso de Nova York que mente, engana a mulher, mata os amigos, faz negócios sujos. Mas você certamente iria jantar com ele!”

E qual era o charme de Pedro I? “Seu caráter, como tenho repetido, era uma mescla de Dom Quixote e Don Juan. Ao fim, é mais um Dom Quixote. Era no fundo mais bom do que mau. E se mostrou como herói na Batalha do Porto, lutando pelas ideias que defendia. Sempre esteve ao lado da liberdade e da justiça. Pedro II era sério, racional, meditava antes de decidir. Mas foi a loucura de Pedro I que ajudou a fazer o Brasil independente.

O senhor cita na sua bibliografia os livros de Laurentino Gomes e Iza Salles, os mesmos que o criticaram no jornal. Como o senhor se defende?  “Estou encontrando o  mesmo nacionalismo que encontrou Pedro I. Dizer que é neocolonialismo de Espanha! Isso é uma grande estupidez. Essa gente acredita que sou um estrangeiro que vai ganhar dinheiro com uma história que só pertence a eles. Gosto muito do livro de Laurentino Gomes. Mas é um livro de jornalista, não é literário. O livro de Iza Salles não é livro de história nem romance. São livros que não viajam. Queria fazer o contrário. Queria contar a história fabulosa desse homem de um modo que não interessa ao nacionalismo brasileiro, no sentido estrito. Estão julgando um barco como se fosse um carro”.

Uma passagem do livro parece ser a mais polêmica, quando Pedro I se casa em uma cerimônia que seria de candomblé. “Essa é uma leitura maliciosa do meu livro. Eu procuro ser fiel ao material histórico, mas dramatizo, invento cenas e diálogos, me interessa entrar na psicologia do personagem, estabelecer conflito. Seu conflito é que é herdeiro mas quer ser homem como os demais. Quando seu pai quer que se case com Leopoldina, porque é um negócio de estado fabuloso, os Habsburgo são a grande potência, ele está enamorado de uma bailarina francesa. Eu inventei um diálogo. Faço uma cena entre o pai e o filho. O pai lhe diz, “você pode amar como homem, mas tem de casar como príncipe”. O filho, que está apaixonadíssimo, tenta por todos os meios convencer o pai. Ele diz uma mentira ao pai. “Já estou casado”. “E com quem está casado?” É aí que ele diz que se casou numa cerimônia africana. Pois havia uma corte africana paralela que era convidada para os eventos reais. Ele inventa isso para tentar enganar o pai.”

O senhor agradece no livro a historiadores que o ajudaram nas revisões. Pode dizer que revisões foram essas? Manuel Lucena, especialista em América do século 19,  foi o primeiro que viu o manuscrito. Devolveu com tantas notas! Uma delas, por exemplo, me dizia que naquela época não se dançava flamengo, as danças espanholas eram outras. Coisas assim: anacronismos, imprecisões. Depois, dois historiadores brasileiros leram também.”

Na Índia, sua obra também foi recebida com polêmica. “Foi uma polêmica terrível. Eles não queriam que o “Sári Vermelho” saísse na Índia também por nacionalismo. Trata de uma personagem real, Sonia Maino [hoje Sonia Gandhi, viúva de Rajiv Gandhi], que é italiana. Não queriam que se falasse da parte italiana da Índia. E conseguiram assustar editores em língua inglesa. Então o “Sári Vemelho” saiu na Alemanha, na França, em vários países, menos na Índia. E há sempre a polêmica com personagens vivos: a imagem que têm de si mesmos é diferente.”

Como se preparou para fazer romance com história? Pode falar de seus  mestres?  “Fui assistente de Dominique Lapierre e Larry Collins. Trabalhei com eles em muitos livros. Escreveram, por exemplo, “Esta Noite a Liberdade”,  um livro fantástico sobre a Índia que hoje é lido nas escolas. É um livro escrito por um francês e um americano. Gente que não tem contato cultural com o tema. É melhor não ter, porque dão perspectiva distinta. Um brasileiro pode se interessar pelos livros de Laurentino Gomes e Iza Salles, mas um espanhol, chinês ou americano, não.”

Alguém já se interessou em fazer um filme com seu Dom Pedro I? “Ainda não. Mas acho que Javier Bardem seria um perfeito Pedro I.”

E quem seria Domitila? “Não sei. Teria de ser uma nova Sônia Braga. Quem seria?”.

Aqui há o mesmo problema com a readaptação de “Gabriela” para a TV. “Não sei qual atriz, mas tem de ser brasileira.”

***

A foto que abre o post, cedida pelo autor, foi feita no quarto Dom Quixote, no Palácio de Queluz, em Portugal, onde nasceu e morreu, aos 35 anos, Dom Pedro I —vá por aqui para visitar o site.

Ao leitor que chegou até o fim, o  blog deixa como brinde o coração de Dom Pedro I, IV de Portugal, pescado do youtube.


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Ficção brasileira lá fora: o Salão do Livro de Paris

Por Joselia Aguiar
21/03/12 18:26

Essa imagem que você vê acima é do espaço brasileiro no Salão do Livro de Paris, que terminou ontem.

Não estive lá, mas pelo que vejo da foto, enviada pela equipe de imprensa da Fundação Biblioteca Nacional (FBN), acho que é bastante parecido com aquele organizado em outubro passado em Frankfurt.

A feira francesa, de que o Brasil se ausentou nos últimos anos, é diferente da alemã. Atende ao grande público, enquanto a de Frankfurt recebe principalmente executivos que vão comprar e vender direitos de livros.

Em Paris, Jorge Amado se tornou  principal tema de uma série de conferências organizada pela Academia Brasileira de Letras e instituições locais: seu centenário se celebra este ano e o autor é conhecido do público francês. Benjamin Moser, biógrafo de Clarice Lispector, fez uma apresentação a respeito da escritora brasileira nascida na Ucrânia, que até fins de abril merece exposição na galeria Espace Des Femmes. Seis ficcionistas contemporâneos viajaram para lá: Adriana Lisboa, Adriana Lunardi, Arthur Dapieve, João Carrascoza, Maria Valéria Rezende e Tatiana Salem Levy.

O leitor deve ter curiosidade no assunto; quem atua profissionalmente no ramo pode ter interesse bem maior por posts como este.

Enviei cinco perguntas para Moema Salgado, coordenadora de ações de promoção do livro brasileiro no exterior, que me respondeu por email.

O mercado francês sempre pareceu acolher bem autores brasileiros. Como isso ocorre nos últimos anos? “Sim, de fato a França é um dos países que mais se interessam e traduzem literatura brasileira. Editoras de variados portes publicam autores brasileiros de diferentes perfis, como Gallimard, Seuil, Métailié, Buchet-Chastel, Anacharsis e Folies d’Encre. Agora, com o reforço no programa de apoio à tradução, o interesse dos franceses tende a aumentar. A imprensa francesa também é receptiva e curiosa em relação aos autores brasileiros. Chama atenção dos franceses a nova produção dos escritores das periferias brasileiras. Sinal disso é que surgiu na França uma editora especializada nesses autores, as Editions Anacaona, que tem como uma de suas metas apresentar a literatura brasileira.”

Por que a ausência do Brasil no Salão do Livro de Paris nos últimos anos? “O Salão do Livro é um grande acontecimento cultural, uma vitrine da produção literária, com características diferentes, por exemplo, de uma feira como a de Frankfurt,  voltada sobretudo para profissionais. Pode ser por isso que o mercado brasileiro tradicionalmente hesitava em investir na sua presença no Salão. Trata-se, no entanto, de um evento frequentado por editoras do mundo inteiro, as quais muitas vezes pautam suas decisões de publicação a partir do catálogo de editoras francesas. Este é um dos motivos por que o governo brasileiro sempre quis, de alguma forma, estar presente, mesmo que simbolicamente. Este ano, o Ministério das Relações Exteriores (MRE), por meio da Embaixada do Brasil na França, e a Fundação Biblioteca Nacional (FBN), vinculada ao Ministério da Cultura, decidiram investir numa presença marcante. Nossa intenção é reforçar essa cooperação nos próximos anos para garantir que o Brasil tenha uma participação constante e relevante. Houve a colaboração de outras entidades, como a Academia Brasileira de Letras (ABL), a Sorbonne e a Unesco”.

Além de Paris, em quais eventos haverá presença maior este ano? “O Brasil é o país homenageado da Feira Internacional do Livro de Bogotá, entre 18 de abril e 1o de maio. E a FBN-Minc, em parceria com o Ministério das Relações Exteriores e a Câmara Brasileira do Livro (CBL), vai participar pela primeira vez com um estande na London Book Fair, entre 16 e 18 de abril. A FBN prepara ainda uma programação para debater, na Festa Literária Internacional de Paraty (FLIP), questões relacionadas a traduções e à presença da literatura brasileira no exterior. No segundo semestre, teremos uma participação reforçada na Feira do Livro de Frankfurt, preparatória da homenagem de 2013.”
 
Os EUA parecem ser um mercado mais difícil. Como tem sido a expansão do programa de internacionalização da literatura brasileira por lá? “O Brasil começa a reforçar a presença do livro e da literatura nacionais em países de língua inglesa. Sinal disso é o interesse do mercado britânico pelo Brasil e a agenda de encontros que a FBN terá na London Book Fair com editores e agentes literários. Os países de língua inglesa são uma nova e importante frente do processo de internacionalização da literatura brasileira. Em setembro do ano passado, uma delegação de editoras britânicas esteve no Brasil para encontros profissionais. Uma nova visita dos britânicos está sendo preparada para este ano. Como conseqüência de todo esse trabalho, espera-se a expansão para o mercado americano, tradicionalmente difícil para autores estrangeiros.”

Quais os números mais recentes do programa de internacionalização da literatura brasileira? “Ano passado, foram aprovados 37 projetos de tradução pela FBN, depois da divulgação do mais recente edital, em julho de 2011. Praticamente todas as editoras que fizeram pedidos foram agraciadas. Este ano, apenas no primeiro trimestre, a FBN já recebeu mais de cem solicitações de apoio para tradução, as quais no momento estão sendo analisadas. Prevêem-se investimentos de US$ 7,6 milhões para o programa até 2020.”

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"Junco", o livro de poemas de Nuno Ramos

Por Joselia Aguiar
20/03/12 12:42

Nuno Ramos, nascido em São Paulo em 1960, é um artista plástico de trajetória reconhecida há bastante tempo —por aqui, leia o primeiro dos vários textos sobre “Bandeira Branca”, sua participação na Bienal ano passado (na Folha, para assinantes).

Sua obra em livros, que não é novidade e data de 1993, só passa a chamar mais atenção de quem faz  as páginas literárias, e não as de artes plásticas, depois de “Ó”, de categoria inclassificável, híbrido de autobiografia e ensaio, que venceu o Prêmio Portugal Telecom em 2009.

O sexto e novo título, “Junco”, que sai pela Iluminuras, reúne pela primeira vez seus poemas, em que combina versos e fotografias. Sobre a obra, o artista conversa hoje com o público, às 20h, em evento gratuito no Sesc Vila Mariana, em São Paulo, como parte da série Sempre Um Papo —por aqui, você visita a agenda inteira, em várias cidades.

A dúvida antes de fazer o post era se devia esperar para ouvir a conversa de hoje à noite, a que quero muito assistir. Achei que os leitores iam gostar de ser avisados; então fiz quatro breves perguntas ao autor, que me respondeu há pouco por telefone, mais para instigar leitores do que concluir o assunto.

 Quando você escolhe dizer o que quer dizer com palavras, e não com objetos ou vídeos? “São atividades cotidianas e paralelas. Não vêm do mesmo lugar e se mantêm separadas. No ateliê, há um trabalho grande de produção: calculo,  compro materiais, lido com técnicos. Escrever é algo mais íntimo, que se torna público apenas quando lanço o livro. Escrevo sempre, em geral entre as onze da manhã e as três da tarde. Quando faço uma obra, às vezes a atividade é ligada à palavra, como escolher um título. Conversar também pode ser muito bom para criar a obra. Mas as antenas funcionam em dois mundos diferentes, não no mesmo.”

Em “Junco”, você se refere a Drummond, particularmente o de “A Máquina do Mundo”, mas na orelha-apresentação a critica literária Flora Sussekind nota aproximações com João Cabral. De que maneira você reconhece a presença dos dois poetas? “Drummond é meu amigo, é o cara de que realmente gosto, o poeta que leio e investigo. Tem uma coisa em Drummond com que me identifico, mais até como artista plástico, que é  certa ambivalência. Cabral é um Drummond que foi coado, sem retórica. Eu me sinto mais como Drummond. Sou retórico, pouco coado, pouco construtivo. Acho que sou nesse livro mais drummondiano que cabralino. E me surpreendou a aproximação com Cabral. Concordo que no livro, a certa altura, dou uma secada.”

Por que demorou 14 anos para concluir “Junco”? Antes de publicá-lo, outros livros ficaram prontos. “Nunca pensei que fosse fazer um livro de poemas. Tentei muito e achei que não ia dar. É um livro sobre minha poética, sobre o lugar de onde crio. Essa cena original se repete, é quase sempre o mesmo poema: a praia, nascer e morrer, o retorno do mar. Cortei muito, até o fim quis corrigir. Foi quando vi que começava a criar outra coisa, aquele último poema é a abertura para algo diferente, me fez ver que o projeto já seria outro.”

De que natureza é seu próximo projeto? “Duvido que faça outro livro de poemas. Comecei algo que pode ser uma novelinha, um poema longo.”

 

 

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Ficção brasileira lá fora: João Almino

Por Joselia Aguiar
19/03/12 21:56

 

 

 

 

De João Almino, vencedor do prêmio Passo Fundo Zaffari & Bourbon e finalista do Portugal Telecom e do Jabuti ano passado, chegam notícias da tradução de seu “O Livro das Emoções” em inglês e de “As Cinco Estações do Amor” em italiano.

Pouco antes, lia por coincidência esse texto aqui, na “Publishing Perspectives”, em que Alane Salierno Mason, uma das principais executivas da WW Norton & Company, tratava da dificuldade de autores estrangeiros para entrar no mercado americano.

O leitor talvez não se lembre, mas desde o ano passado o Brasil turbinou seu programa de internacionalização da literatura brasileira –tratei em vários posts do antigo blog, vá por aqui para chegar lá.

Perguntei a João Almino como ocorreu a tradução nos EUA; por pesquisas que fiz há pouco tempo, me parecia de fato mais difícil ingressar ali do que no mercado europeu. Almino, para quem não sabe, é, além de escritor, diplomata de carreira, então me parece alguém com olhar privilegiado do Brasil no exterior.

Sua resposta, editada: “O percentual de traduções nos EUA é bem menor do que na Europa, algo em torno de 3% do total de livros ali publicados. Faria sentido que, na medida em que a projeção externa do Brasil aumenta, sua expressão literária também se tornasse mais visível. Creio, contudo, que isso ocorre de maneira muito gradual. Não há nada equivalente hoje em dia ao boom dos escritores latino-americanos de décadas passadas. O interesse por traduções, quando há, é mais difuso. No caso dos EUA e do Reino Unido, existe já há algum tempo uma tendência para valorizar as expressões em língua inglesa de minorias étnicas estabelecidas nesses países. Sou representado por uma agência literária, mas minhas traduções ocorreram em geral por contatos diretos. Minhas tradutoras — no feminino, pois coincientemente são todas mulheres, com uma exceção — ou eu mesmo os submeti a editoras e num dos casos o interesse partiu do próprio diretor de uma coleção na editora, coleção não necessariamente relacionada com o Brasil.”

Essa série de posts, “Ficção brasileira lá fora”, vai abordar o tema a partir de agora.

Um dos próximos será sobre o Brasil no Salão do Livro de Paris.

Por aqui, você chega até a estante afetiva de João Almino no antigo blog.

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"O Filho Eterno" no teatro: vá ver

Por Joselia Aguiar
18/03/12 21:43

Não sei se porque o ator Charles Fricks (acima) se parece com Nanni Moretti, de quem gosto tanto, a peça “O Filho Eterno” me ganhou já no primeiro minuto.  Tem o humor e a densidade naquela medida que Moretti encontra para seus filmes, o que para mim é um grande elogio.

O monólogo se baseia no livro homônimo de Cristovão Tezza sobre paternidade –autor veterano, como o leitor deve se lembrar, venceu com a obra todos os prêmios literários de 2009. É encenado pela Cia de Teatro Atores de Laura, com direção de Daniel Herz. Após temporada carioca, está em cartaz no Sesc Consolação, em São Paulo, por mais três semanas.

Encontrei um trechinho no youtube, abaixo. Recomendo muito.


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Barsa, novos selos, classe C

Por Joselia Aguiar
16/03/12 17:35

Tão logo a Enciclopédia Britânica anunciara o fim de suas edições em papel, a Barsa se apressou em avisar que nada muda em países como o Brasil, onde espera que as vendas  continuem a crescer. Sai mês que vem, aliás, a nova edição impressa, com 18 volumes e 135 mil verbetes.

Perguntei à Barsa qual a expectativa de expansão no mercado brasileiro e quem é seu principal público. As respostas são de Sandra Cabral, diretora de treinamento e marketing: por aqui, acreditam que vão manter os 10% ao ano –o  percentual em 2011, quando foram vendidas 70 mil coleções. Os grandes compradores estão na classe C; são pais preocupados com a educação dos filhos. 50% desse público está concentrado nas regiões Norte e Nordeste, os outros 50%, nas demais regiões. A maioria das vendas, 70%, ocorre pelo modelo de porta a porta.

Essa notícia me lembrou o que disse no fim do ano passado John Makinson (texto que fiz na Folha, para assinantes), CEO da Penguin, quando da aquisição de 45% da Companhia das Letras: os leitores daqui são não só potenciais consumidores de livros digitais; ainda seremos grandes consumidores de impressos.

A semana que termina é prolífica em bons anúncios das casas editoriais, uma aposta de avanço do setor: a Companhia das Letras divulgou quatro novos selos, mais populares (no blog da editora) esta manhã; o grupo Leya criou um só para fantasia; ontem, a PubliFolha apresentou o Três Estrelas, para ampliar a presença no segmento de não ficção; a Globo Livros avisa que em breve terá novos selos para divulgar (todas notícias no Publishnews).

Sobre leitores, Classe C e porta a porta: prometo longo e atrasado post nos próximos dias.

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Um Kafka gonzo no anúncio da GoodBooks

Por Joselia Aguiar
15/03/12 13:57

GoodBooks é uma loja de livros e música online com fins beneficentes. Seu lema, algo como “somos uma alternativa à Amazon”.

Essa animação, que vi ao mesmo tempo nos murais de Mirna Queiroz e Thiago Blumenthal, presta homenagem a Hunter S. Thompson, criador do jornalismo gonzo, num  anúncio de “A Metamorfose”, de Kafka.


 

A agência é a String Theory, da Nova Zelândia. O diretor, Buck. O lucro com as vendas é doado à Oxfam, informa a GoodBooks.

Kafka, o dedetizador: post da semana passada.

 

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Enciclopédia X Wikipedia

Por Joselia Aguiar
14/03/12 12:50

As notícias sobre a morte da Enciclopédia Britânica são um pouco exageradas. No fim da tarde de ontem, a empresa anunciou que, depois de 244 anos, vai deixar de imprimir seus 32 volumes. Vi amigos no Facebook a lamentar o fim daquela que isso ou aquilo na infância.  Atenção: a edição continua a existir em versão digital (leia aqui no “Guardian”, aqui no “Financial Times”).

A web, como se sabe, é a principal concorrente. Os números de queda nas vendas dão a medida do estrago: em 1990, foram compradas 120 mil coleções nos EUA, em 2010, apenas 8.500. E a concorrente é principalmente a Wikipedia, como também se sabe, com seus 3, 9 milhões de verbetes, atualizados a cada instante por infinitos voluntários em todo o mundo. A Britânica reúne 120 mil verbetes, que só podiam ser mudados a cada nova edição bienal –e se você pensar que ninguém renova a enciclopédia de casa a cada dois anos, é ainda maior o estado de desatualização do leitor fiel que, por algum motivo insondável, se recuse a procurar mais sobre o assunto na internet.

O curioso é ler hoje pela manhã nos obituários publicados na imprensa inglesa a história de que o aventureiro Ernest Shackleton, em sua célebre expedição à Antártida no começo do século 20, queimou páginas da Britânica para conseguir se aquecer! Parece piada de José Simão.

O que merece reflexão é o seguinte: os executivos da Enciclopédia Britânica afirmam que apenas 15% da receita corresponde  hoje a vendas de exemplares impressos. A maior parte do que faturam vem da oferta de serviços, inclusive digitais.

Ou seja, a Enciclopédia Britânica não é só um ajuntamento de dados com maior ou menor velocidade e precisão; é uma tecnologia de escolher, hierarquizar, contextualizar e apresentar informação. Quem sabe agora, sem ter de se ocupar com toda a maluquice que é a logística de reimpressões e de vendas, usará dinheiro e sobretudo tempo para fazer melhor o que faz  –e, por isso, justificar o valor cobrado, uma vez que a Wikipedia é gratuita.

Por aqui, você chega até o site da Enciclopédia Britânica e encontra sua versão para iPad (de onde pesquei a imagem acima).

ATUALIZAÇÃO às 18h15 –  Esse slide-show  no UOL Educação mostra curiosidades na história da Enciclopédia Britânica impressa.

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Érico responde a Clarice sobre os críticos

Por Joselia Aguiar
12/03/12 22:02

 Aos 13, li o  “O Tempo e O Vento” na edição de quatro volumes em papel bíblia da Nova Aguilar. Usei muito as aulas de química, física e matemática para avançar na leitura. Sentava no fundo da sala, as pernas cruzadas em posição de lótus, o livro disfarçado no colo.  Não entendi vários –vários– dos capítulos que tratavam de história política do sul do país. E me apaixonei por Rodrigo Terra Cambará, binesto do Capitão Rodrigo e de dona Bibiana, principal personagem do volume “O Retrato”. Quase perdi nas três disciplinas. Voltei milagrosamente para a média azul nas provas finais. Era o fim precoce da adolescência. 

Atualização no dia 14/03, às 18h44 – por aqui, leia sobre a adaptação para o cinema de “O Tempo e o Vento”, que soube pelo blog Mundo Livro.

Esses dias me ocupei com umas cartas antigas e livros em que o escritor aparece. Vim aqui para deixar um vídeo e um trecho de algo que acabei de ler.

Então repórter, Clarice Lispector faz perguntas a Érico em fins dos anos 1960. A íntegra está no volume “Entrevistas”. É organizado por Claire Williams, saiu pela Rocco. Além desta com Érico, há mais três dezenas de conversas com gente de todas as áreas, de Elis a Millôr, de Neruda a Zagallo.

E lá vai a primeira pergunta, nada simples.

-Érico, por que você acha que não agrada aos críticos e aos intelectuais?

-Para começo de conversa, devo confessar que não me considero um escritor importante. Não sou um inovador. Nem mesmo um homem inteligente. Acho que tenho alguns talentos que uso bem…mas que acontece serem os talentos menos apreciados pela chamada “crítica séria”, como, por exemplo, o de contador de histórias. Os livros que me deram popularidade, como “Olhai os Lírios do Campo”, são romances medíocres. Nessa altura me pespegaram no lombo literário vários rótulos: escritor para mocinhas, superficial etc. O que vem depois dessa primeira fase é bastante melhor mas, que diabo! pouca gente (refiro-me aos críticos apressados) se dá ao trabalho de revisar opiniões antigas e alheias. Por outro lado, existem os grupos. Os esquerdistas sempre me acharam acomodado. Os direitistas me consideram comunista. Os moralistas e reacionários me acusam de imoral e subversivo. Havia ainda essa história cretina de norte contra sul. E ainda essa natural má vontade que cerca todo o escritor que vende livro, a ideia de que best-seller tem de ser necessariamente um livro inferior. Some tudo isso, Clarice, e você não terá ainda uma resposta satisfatória à sua pergunta. Mas devo acrescentar que há no Brasil vários críticos que agora me levam a sério, principalmente depois que publiquei “O Tempo e O Vento”. Bons sujeitos!”

 

A engraçada modéstia de Érico, o sucesso com os leitores e a dureza dos críticos: quatro décadas depois, esses temas retornam na conversa de Luis Fernando Verissimo, filho de Érico, com Sérgio Rodrigues no Instituto Moreira Salles, no Rio. Estava por lá naqueles dias de janeiro e consegui assistir. Conhecido por seu laconismo, Luis Fernando falou bastante!, como se costuma prever nas circunstâncias  em que vai tratar do pai. As perguntas de Sérgio, ótimas, ajudaram.



 

Encerro o post trazendo de volta uma das frases de Érico lá em cima: Some tudo isso, Clarice, e você não terá ainda uma resposta satisfatória à sua pergunta. 

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