Flip 10: Vila-Matas, malogrados e escritores que não devem ser vistos
08/07/12 10:44Escutei ontem, o dia inteiro, gente dizer que se frustrou com a mesa tão esperada de Jonathan Franzen. À noite, a conferência de Enrique Vila-Matas respondeu –sem esse propósito, claro– aos que esperavam performance diferente do romancista americano: a literatura começou a desandar depois que os autores passaram a ser vistos, disse o catalão, lembrando outro autor, William Gaddis, para quem escritores devem ser lidos, não devem ser vistos. A expectativa de vê-los e de serem vistos alterou a lógica, o andamento. Esse é um dos motes de “Música para Malogrados”, o ensaio lido ontem por Vila-Matas, que reconstituiu sua trajetória a partir do que a norteou, a leitura de outros autores e o embate entre o mercado e a arte, tendo como princípio o de “nunca trair a si mesmo”.
A mesa extra de Vila-Matas, em substituição à do francês J. M. Le Clézio, que cancelou sua vinda poucos dias antes, seguiu formato mais conhecido pelo público europeu, e não o brasileiro, acostumado a algo como o talk-show americano. Conferência é um troço pouco usual por aqui, o que é uma pena. Desacostumada, a plateia não sabe aproveitar.
O catalão provocou risos algumas vezes e, quando a piada não funcionava, reclamava do insucesso. Um dos momentos cômicos foi a confissão –ou a invenção– de que, às vésperas do lançamento de “Ar de Dylan”, o mais recente, sua barba cresceu mais que o normal, um efeito do medo, como lhe dissera certa vez um toureiro. Com a nova obra, explicou em outro texto lido ontem, inaugura agora uma terceira fase: depois de livros em que indagou sobre a ausência de sentido e de outros em que se deteve na memória literária, sua “automitografia”, haverá outro tipo, em que procurará o que chamou de brilho autêntico.
Antes de chegar aos malogrados e ao “Ar de Dylan”, leu um texto em que homenageava Antonio Tabucchi, italiano que também escreveu em português e era leitor de Fernando Pessoa e Carlos Drummond de Andrade. Vila-Matas disse que conheceu Tabucchi no balneário espanhol onde passavam férias, nos anos 1950 –outra invenção?. Voltaram a se reencontrar três décadas depois. O vizinho era escritor: Tabucchi lançara “Mulher de Porto Pyn”, que, como explicou Vila-Matas, o levou a escrever “Lembranças inventadas”, título que o denuncia.
Tabucchi foi o nome mais lembrado, não o único. Entre artistas e escritores, o catalão se referiu a Beckett, Bernhard, Calvino, Walt Whitman, sobretudo Marcel Duchamp, de cuja obra “Ar de Paris” veio o título “Ar de Dylan”. Com ele, encerrou a conferência, um enigma: por que Duchamp voltou a Paraty?
É a segunda vez de Vila-Matas em Paraty. Tabucchi, várias vezes convidado, cancelou sua vinda duas vezes, a última em 2011.
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Tem muito mais coisa para postar aqui. Por ora, deixo o endereço do blog de Enrique Vila-Matas, recomendo muito: vá por aqui. O leitor encontra lá uma prévia do “Música para Malogrados”.
Nunca fui em feiras literárias, mas fora desse universo, o formato mais convencional é o da palestra mesmo. Não é? Aliás, acho essas conversas com tom de informalidade sempre insatisfatórias, parece que ninguém desenvolveu uma ideia direito.
Adorei, simplesmente adorei a conferência de Vila-Matas. Estava presente e curti muito o texto, todo o percurso que criou e os enigmas! Agora fui até o blog dele, por sua sugestão, e li o “intróito” da conferência. Juro, amaria ler o texto todo! Se aparecer em algum lugar, por favor me avise!
Abraços
Maurette
Maurette, acho que daqui a pouco a íntegra estará ao nosso alcance. 🙂 Apareça