Flipoços, Bienal do Amazonas, Festipoa e outras festas literárias
26/04/12 13:12Mal acaba a primeira Bienal do Livro de Brasília, que trouxe ao país gente conhecida não só pela importância do que escrevem mas também pelo que dizem e fazem como cidadãos, um deles o poeta argentino Juan Gelman, a ficcionista e ativista americana Alice Walker e o Nobel nigeriano Wole Soyinka, por aqui até o site oficial, e logo começam mais duas feiras/festas literárias.
A partir deste feriadão e na semana seguinte, ocorrem a Flipoços, em Poços de Caldas, interior mineiro, vá por aqui até o site oficial, e a Bienal do Livro do Amazonas, em Manaus, no nosso tão distante Norte, vá por aqui.
Faz uma semana, em Porto Alegre, realiza-se sua Festipoa, por aqui.
Eventos literários têm se multiplicado no país e são hoje 200, com vendas de livros que devem crescer 20% este ano pelos cálculos da Fundação Biblioteca Nacional, informa o jornal “Valor Econômico” de ontem, texto disponível por aqui para não-assinantes.
Numa conversa informal pelo Twitter hoje cedo, veio o assunto: só bastam crescer em número e vendas, não têm de se aperfeiçoar na formação de leitores? Claro que sim, mas antes é preciso que existam, certo? Durante muito tempo –e, graças!, um pouco menos nos últimos anos, possivelmente porque nos acostumamos– as feiras literárias eram quase que combatidas, como se fossem alguma excrescência num território tão poético e nobre como o dos livros.
Deu no que deu: nosso número de leitores de livros nunca cresceu como o do número de alfabetizados, ou seja, o índice de leitura é pífio (menos de dois livros inteiros por ano, por habitante) não só porque até outro dia éramos um país de muitos analfabetos, mas porque muita coisa deixou de ser feita, em termos de políticas públicas, para promover a leitura.
As feiras são a única coisa a fazer? Claro que não. Mas antes que algum participante use o palco para recriminá-las –sim, isso acontece!–, convém que apresente no mesmo ato um ótimo plano B, C ou W, que inclua levantamento de custos, logística e previsão de resultados. Como diz o povo sabiamente: falar é fácil. Precisamos de ideias e ninguém apresenta, só reclama.
Como convidada da Flipoços, sigo amanhã para conhecer essa, segundo dizem, agradabilíssima cidade mineira –me digam qual cidade mineira não é agradabilíssima. Na abertura, haverá mais uma participação histórica do crítico literário Antonio Candido,94 anos –na foto que abre o post, ele está ao lado de Gisele Corrêa Ferreira, a curadora. Ano passado, Candido foi à Flip, que desde sua estreia, há dez anos, tentava levá-lo até Paraty.
Uma atração internacional comparece este ano, Franca Treur, autora holandesa, numa mesa de que serei a mediadora. Nos próximos posts, contarei aqui sobre a conferência de Candido e a conversa com Treur, que lança “Confetes na Eira” pela Livros de Safra, uma jovem editora paulistana.
Na Bienal do Amazonas, entre os convidados do exterior, há o português Valter Hugo Mãe –será que vai repetir a performance da última Flip?– e o argentino Andrés Neuman. À distância, vou tentar contar aqui um pouco do que acontecer por lá.
ATUALIZAÇÃO às 14h10 – Via “Publishnews”, leio sobre mais dois eventos nos próximos dias: a segunda edição do Festival Literário de Votuporanga (FLIV), no interior de São Paulo, e a 1ª Odisseia de Literatura Fantástica, em Porto Alegre.
Post de ontem no blog: Bibliotecas e formação de leitor, uma conversa com Felipe Lindoso
Post do mês passado no blog: Entrevista com Juan Gelman, sobre poesia e política
Josélia, lendo agora o comentário do Vicente Alaran, me lembrei: minha mãe fazia sequilhos de polvilho doce, e para mim eram uma delícia indescritível. Vou ver se recupero a receita e te conto.
ufa! já tava começando a pensar que era alucinação minha 🙂
Algumas pesquisas mostram que o brasileiro em média lê 4 livros por ano. Em outas dizem que é menos do que 2. Afinal, quem está certo?
oi Rafa, é que há uma conta que considera livro didático, outra que tira livro didático. È tudo bastante subjetivo. Ao retirar livro didático, tenta-se avaliar quantos leem “por conta própria”, sem obrigação escolar. Mas isso é subjetivo porque se leem livros escolares por gosto, e livro é livro, um livro didático não é menos livro.
Li uma ótima entrevista com Franca Treur no blog do Luciano Trigo, no G1. Eu adoro essas escritoras iniciantes da Europa, Lolita Pille, Charlotte Roche e Amelie Nothomb, que de iniciante não tem nada.
Gildo, conheço a Franca e a Charlotte, mas não a Lolita e a Amelie. Vou pesquisar.
Josélia,
Tenho acompanhado uma situação interessante nos últimos tempos. Em dezembro de 2011, participei da publicação (como coautor) de um livro sobre o poeta neo-concreto Gastão Debreix. Por se tratar de poesia visual tal livro é fácil de ler e, por isso, tem me proporcionado uma experiência, mesmo que empírica, muito boa que, se não traz esclarecimentos sobre o potencial de leitura no Brasil, ao menos serve para aumentar o leque de questionamentos.
Primeira constatação: os consumidores de literatura no Brasil (seja poesia, ficção e outros) têm dificuldade em assimilar aquilo que não possui referência (grande editora, participação em feira, exposição na mídia…); Segunda: é inegável o potencial de leitura nas comunidades e regiões pobres, onde existe um batalhão de pessoas ávido a debulhar com os olhos todo tipo de literatura; Terceira: ao mesmo tempo que publicar um livro se tornou algo fácil e banal, a qualidade da produção independente (ou alternativa) é, em grande parte, muito ruim. Isso “queima o filme” de quem está “fora do circuito”. Última: o futuro do livro no Brasil, ao menos, está nos leitores da periferia (o que não implica que os temas abordados devam ser estritamente relacionados à condição social dos mesmos). Sendo assim, penso que as Feiras/Festas são muito oportunas, principalmente quando afastadas do “Centro”.
Luciano, concordo com você, vou fazer mais posts sobre isso.
Uma pergunta que sempre me ocorre quando leio sobre índices de leitura: por que nunca fizeram uma pesquisa sobre o prazer de ler? Por que o aspecto numérico (tantos livros lidos per capita) predomina sobre um possível (e, na minha opinião, importante) diagnóstico sobre o prazer de ler?
oi Vicente, porque é difícil fazer esse tipo de pesquisa, sobre prazer de ler. Os números ajudam a “contar”. São uma forma de entender o mundo também.
Josélia: com certeza, os números são também uma forma (eficaz) de entendimento o mundo. Desde pelo menos os gregos. Só ponho em questão (e não se trata de ir totalmente contra, mas de saudavelmente problematizar o tema), repito, só ponho em questão o retrato meramente numérico que sai dessas pesquisas, do tipo: o brasileiro lê tantos livros por ano etc. Isto lembra um pouco aferições similares no campo econômico: o brasileiro consome tantos quilos de feijão por ano. Creio que leitura possui outras especificidades. Por exemplo: um leitor que lê dez livros por ano é melhor leitor do aquele que lê apenas dois? E o ritmo da leitura? E a natureza do que se lê? E o tempo de cada um? Ler depressa ou ler devagar? E ler o mesmo livro várias vezes? Sim, uma pesquisa sobre o prazer de ler (sobre o prazer, o tempo, o jeito de se ler) é mesmo muito difícil, talvez impossível de ser feita. Mas almejá-la (ou sonhá-la) não chega a ser um pecado, não é?
Vicente, mas pense – todo mercado tem seus números e o de livros no Brasil parece ser o único que quase não tem números, essa Retrato da Leitura no Brasil é muito recente. Pense – nunca tínhamos números, só agora começamos a ter. Antes era só chute, deus-dará. É muito sério isso. Repito – mal tivemos números, mal temos números disso. Não tem investidor que ponha dinheiro num troço desse.
É, de fato, lamentável essa carência estatística. E é louvável traçar esse retrato. Mas, utópico que sou, com a ingenuidade quase sempre ensandecida dos utópicos, ainda sonho com um perfil sobre o ato de ler no Brasil mais além dos meros números.
Corrijo a tempo um erro de grafia no nome da mãe do Frei Betto: onde escrevi Stella Libânio Cristo, deve-se ler Maria Stella Libânio Christo. Tais equívocos não ficam bem em sábias culinárias.
Já que você não conhece Poços de Caldas, que eu adoro, vão aqui algumas dicas: não deixe de visitar o Palace Hotel (se você já não for se hospedar lá); se precisar de pretexto, funciona lá uma galeria de “arte” e antiguidades. O hotel é de 1929 e pertencia a um cassino (ou este pertencia àquele), cujo prédio, bem próximo do hotel, pertence hoje à secretaria da cultura, atualmente em reforma. Na praça em que fica esse hotel, que é linda, tem um café bem charmoso.
Se tiver um tempinho e for gulosa como eu, sugiro ir até a pequena Caldas, longe dali cerca de meia hora, onde as padarias fazem um biscoito de polvilho indescritivelmente gostoso (e enorme); é só perguntar no centro da cidade onde tem que todo mundo sabe. Recomendo também a vista do morro do Cristo e da pedra balão.
quero conhecer esse hotel dos anos 20. esse polvilho é doce ou salgado? gosto de biscoito de polvilho doce, do que as tias de minha mãe faziam.
Fiquei em dúvida se o que você chama de “biscoito de povilho doce” é exatamente isso ou se trata de “biscoito doce de polvilho”.
Conheço o polvilho doce e o polvilho azedo (que talvez seja o que você chama de salgado). O biscoito (enorme)de que te falei é salgado, feito, salvo melhor juízo, com polvilho azedo. Mas mineiro, você sabe como é, faz de tudo com os dois tipos de polvilho. Eu mesma vi na padaria que frequento em Caldas (padaria Brasil, se não me falha a memória) outros tipos de biscoito, embalados, além daquele que adoro, que não é embalado e deve ser comido fresco, embora eu o consuma até mesmo quando está velho de dias e duro como pedra.
Boa estadia em em Poços. O restaurante do Palace acho que atende a não hóspedes; a comida não é grande coisa, mas o ambiente é muito bonito e agradável. .
Ayde, o polvilho doce é diferente do azedo, o azedo é o mesmo dos biscoitos Globo, famosos no Rio, não?
Aqui vou eu com uma pequena notinha a respeito do tema: todos os biscoitos de polvilho (refiro-me aos sequinhos, crocantes, ruidosos ou estalantes, como se prefira) são feitos com polvilho azedo. Com o polvilho doce, faz-se, por exemplo, outro pitéu mineiro, que é o biscoito de queijo — este não é crocante, apresenta o dorso (sim, biscoitos possuem dorso, acho eu) mais liso e sua densidade lembra a do pão de queijo. O qual, como se sabe, também pode ser feito com polvilho doce (eu mesmo, às vezes, o faço deste modo), mas fica diferente do pão de queijo popularmente conhecido Brasil afora — este com polvilho azedo. Como se vê, o tema é vasto pelos territórios dos fornos mineiros. Possui desvios e variantes sobre modos de fazer e apreciar. Mas como resistir a tal assunto? Ah, sim: o biscoito Globo, do Rio, é feito com polvilho azedo, mas é doce. Ah, sim (2): a pequena notinha ficou enorme. Mil perdões desde Minas.
Vicente, os biscoitos Globo são salgados! E me diz, esses pequenos biscoitos brancos, às vezes chamados de sequilhos, são feitos ou não de polvilho (doce ou salgado)? Não sei se já comi pão de queijo feito de polvilho doce…
Os chamados sequilhos (Pedro Nava, se não me engano, gostava especialmente dessas iguarias) são, na verdade, feitos com farinha de trigo. Dona Stella Libânio Cristo, em seu “Fogão de Lenha”, tem uma bela receita para os denominados “Sequilhos do Imperador”. Portanto, nesse caso já saímos dos domínios da mandioca (polvilho) para os do trigo (a farinha). Ah, sim (3): sobre o biscoito Globo, do Rio, minhas papilas mineiras sempre detectam ali algo adocicado, mesmo que, como você diz, tenha lá o sal a preponderar. Abraços
Vicente, vou ter de assuntar com minha mãe sobre esses tais biscoitos de polvilho que as tias dela faziam no interior baiano, será que são mesmo de trigo? Depois volto aqui pra dizer…
na verdade os biscoitos Globo vêm nos sabores salgado e doce (ou pelo menos era assim no tempo em que eu frequentava a praia no Rio e se amarrava cachorro com linguiça). agora, tb é verdade que mesmo os salgados têm algo de adocicado, como observou muito bem o Vicente. então, apesar de ambos serem feitos do tal polvilho azedo, alguma coisa a mais entra na fórmula pra produção do biscoito doce…