Enciclopédia X Wikipedia
14/03/12 12:50As notícias sobre a morte da Enciclopédia Britânica são um pouco exageradas. No fim da tarde de ontem, a empresa anunciou que, depois de 244 anos, vai deixar de imprimir seus 32 volumes. Vi amigos no Facebook a lamentar o fim daquela que isso ou aquilo na infância. Atenção: a edição continua a existir em versão digital (leia aqui no “Guardian”, aqui no “Financial Times”).
A web, como se sabe, é a principal concorrente. Os números de queda nas vendas dão a medida do estrago: em 1990, foram compradas 120 mil coleções nos EUA, em 2010, apenas 8.500. E a concorrente é principalmente a Wikipedia, como também se sabe, com seus 3, 9 milhões de verbetes, atualizados a cada instante por infinitos voluntários em todo o mundo. A Britânica reúne 120 mil verbetes, que só podiam ser mudados a cada nova edição bienal –e se você pensar que ninguém renova a enciclopédia de casa a cada dois anos, é ainda maior o estado de desatualização do leitor fiel que, por algum motivo insondável, se recuse a procurar mais sobre o assunto na internet.
O curioso é ler hoje pela manhã nos obituários publicados na imprensa inglesa a história de que o aventureiro Ernest Shackleton, em sua célebre expedição à Antártida no começo do século 20, queimou páginas da Britânica para conseguir se aquecer! Parece piada de José Simão.
O que merece reflexão é o seguinte: os executivos da Enciclopédia Britânica afirmam que apenas 15% da receita corresponde hoje a vendas de exemplares impressos. A maior parte do que faturam vem da oferta de serviços, inclusive digitais.
Ou seja, a Enciclopédia Britânica não é só um ajuntamento de dados com maior ou menor velocidade e precisão; é uma tecnologia de escolher, hierarquizar, contextualizar e apresentar informação. Quem sabe agora, sem ter de se ocupar com toda a maluquice que é a logística de reimpressões e de vendas, usará dinheiro e sobretudo tempo para fazer melhor o que faz –e, por isso, justificar o valor cobrado, uma vez que a Wikipedia é gratuita.
Por aqui, você chega até o site da Enciclopédia Britânica e encontra sua versão para iPad (de onde pesquei a imagem acima).
ATUALIZAÇÃO às 18h15 – Esse slide-show no UOL Educação mostra curiosidades na história da Enciclopédia Britânica impressa.
Lembro que, quando era pequena, tinha várias enciclopédias. O tempo passou e, hoje, para pesquisar sobre qualquer coisa, basta ir rapidinho no google. Mas eu sinto tanto a falta de “pegar” na enciclopédia! Pode ser um tanto anacrônico, mas é fato. Assim como ainda não me acostumei aos livros digitais, acho que não vou me acostumar à enciclopédia digital. Outra coisa de que me dei conta é que cada vez menos as pessoas procuram em dicionário “de verdade”, enquanto eu não consigo viver sem ele.
Já o que tu diz sobre a importância de diversas fontes, concordo plenamente.
Juliana, pesquisar no google é hoje o “pesquisar na enciclopédia”. E exige a mesma ciência: saber escolher, avaliar se a fonte é confiável ou não e com qual margem de confiabilidade…
Sim, o pesquisar no google é o “pesquisar na enciclopédia”. O problema é que normalmente as pessoas copiam e colam, além de todos esses outros problemas que citaste. Com as enciclopédias, as pessoas pesquisavam (várias fontes), juntavam as informações mais relevantes e ainda escreviam um novo texto. Pra fazer um trabalho, hoje em dia, as pessoas nem precisam ler…
Sim, você tem razão. O control C + Control V…Conheço professsores que pegam trechos dos trabalhos e põem no google, para descobrir muitas vezes de onde vem o plágio.
Juliana, sinto a mesma falta. Adorava folhear o volume 1 da Barsa, que era o índice, porque havia sempre uma pequena descrição de cada verbete antes de indicar o volume e página em que ele estava localizado. Sentava por horas lendo esses pequenos textos do Índice da Barsa – não por acaso, o mais castigado entre todos os 20 volumes da Enciclopédia…
Elaine, pegar uma enciclopédia ou seja lá o que for é insubstituível. Virar uma página e sentir o cheiro do livro não tem preço. E eu acho que nunca vou me acostumar com esses digitais. Pelo menos espero. 😉
Um outro problema da Wikipedia talvez seja a tal colinha de internet, o ordinário, o superficial ligado a certos assuntos. Explico com um exemplo:
Sou revisora, e semana passada trabalhava na edição atualizada de um livro, digamos, com curiosidades históricas sobre minha cidade. Com certo poder de intervenção, volta e meia ia à internet à procura de detalhar as atualizações.
Acredite, frequentemente o que encontrava havia sido retirado… daquele mesmo livro. Páginas e páginas (inclusive dona Wikipedia) simplesmente “chuparam” informações de dez anos atrás e boa!
Fora o fato de ter de filtrar abordagens intencionalmente ideológicas. Difícil…
muito boa essa historia, Leticia. Saber quem produz a informação é parte da informação. Não existe isso de mediador “neutro” (mesmo que o mediador tenha as melhores intenções). Para complicar, os da Wikipedia são anônimos. Gosto muito da ideia da Wikipedia, repito. Mas tem limites, como quaisquer outros meios de informação. E não saber quem escreve, para mim, é um dos maiores.
O que você deveria escrever, Josélia, é que a Wikipidia não tem concorrente. É muito melhor e mais rica em todos os aspectos do que a Enciclopédia, que se tornou obsoleta.
Bruno, não sei o que quer dizer com “melhor” ou mais “rica” (textos longos não são necessariamente melhores se não há nexos, sentidos). Acho a Wikipedia uma ótima idéia. Mas não é, nunca será, minha única fonte de informação. Lamento quando vejo que há gente nas novas gerações que pensa mesmo que podemos viver com apenas UMA fonte de informação. No meu tempo de escola, era preciso consultar no mínimo três fontes e era parte do trabalho dizer no que concordavam ou discordavam…
Joselia, quando digo melhor, quero dizer a informação é mais diversa(vindo de diferentes fontes) e mais precisa (passível de ser corrigida) e, acrescento, extremamente dinâmica (fotos, gráficos, notas de roda-pé). A Wikipedia democratizou o saber graças ao Web. Eu não sou da “nova geração”, tenho 50 anos. Há outras fontes, claro, mas se quero ler, por exemplo, sobre Dresden, penso que a Wikipedia é a melhor fonte de informação.
Bruno, passível de ser corrigida, sim; mais precisa, não necessariamente. A rapidez com que pode ser alterada é, aliás, uma de suas susceptibilidades! As várias fontes citadas, ok. Mas e quem escolheu as fontes e escreveu o verbete? Alguns verbetes não têm sentido, uma frase contradiz a outra. Não estou dizendo que não é muito legal. Você pode ter 50, mas o pensamento do “pronto, acabou o que existiu” é algo muito próprio de qualquer nova geração. 🙂 E seja bem vindo ao blog.
Josélia, obrigado pelo Bem Vindo ao blog. Já faz algum tempo que eu leio esse blog porque gosto de ler sobre livros. Concordo que há problemas com a rapidez na alteração das informações e sobre as fontes. No entanto, li que Wikipedia tem um grupo de pessoas que controlam e revisam “novas entradas” de dados em vários tópicos. Como qualquer pessoa com internet e com uma senha pode alterar qualquer artigo no Wikipedia, esse controle torna-se necessario. Mas um artigo sobre a Polônia em inglês, escrito e fundamentado com várias referências, é um prazer de ler. Por outro lado, um artigo em português sobre a poeta Ana Cristina César é bastante preciso, revelando como e onde ela morreu. E isso sem citar nenhuma fonte! É por essas e outras que sou um fã de Wikipedia.
Bruno, mas citar fonte é importante. Vou depois fazer um post só sobre nota de rodapé –como são estigmatizadas, coitadas. E se as pessoas soubessem para que servem! Pode aguardar.
Sem contar os inúmeros erros de português. Há verbetes da Wikipedia que são tão mal escritos que nem dá para compreender o que seu autor quis dizer. Uso, sim, a Wikipedia como uma fonte de consulta, mas não é a minha principal.
Não acho que a Enciclopedia Britannica esteja obsoleta, de forma alguma. O seu material de trabalho é mais atual que nunca: a informação. E ela se cerca sempre dos especialistas mais conceituados para redigir seu verbetes – cuidado que a Wikipedia agora tem, com os acordos que vem fazendo com a comunidade científica.
Elaine, pois é. Acho que o mais importante é que as pessoas entendam que não podem ter uma fonte de informação apenas; e que uma fonte não vai lhe dizer “a verdade” do que quer que seja.
Decisão acertada da Enciclopaedia Britannica, assim não virará uma outra Kodak da vida.